Imagine por um momento que o ano de 2022 esteja acabando, num piscar de olhos chega dezembro. Você provavelmente teve esse sentimento no fim do ano passado. Pois bem, é naquele clima de fim de ano que você escuta uma movimentação estranha no escritório quando seus colegas de trabalho resolvem fazer um “bolão” para a Mega da Virada. Mesmo sem acreditar que a sorte vai mudar a sua vida, você pondera o prêmio pelo custo da aposta, apenas 30 reais. E aí vem a pergunta: é melhor entrar ou ficar de fora?
A resposta não é simples, mas a verdade é que a grande maioria das pessoas entra. E existe até uma sigla para isso: FOMO (Fear Of Missing Out, ou “medo de ficar de fora”). Ou seja, a imagem de ver todos os seus amigos ricos enquanto você trabalha dói tanto quanto a visualização de todos tomando cerveja e você no suco de laranja, ou pior, Heineken zero.
E é mais ou menos isso que faz com que historicamente o brasileiro insista em investir mal. Recentemente, a Alaska Investimentos fez um estudo com o comportamento dos seus cotistas nos últimos cinco anos de histórico do fundo e cerca de 50% dos resgates foram efetuados por cotistas que passaram menos de um ano investidos. Você deve saber que o horizonte de investimento ideal para investimentos em um fundo de ações é de no mínimo cinco anos, pois não temos a mínima ideia do que vai acontecer em 2022, que, por sinal, tem o tempero “especial” das eleições. Por isso a importância de horizontes mais longos ao tomar risco, no curto prazo a renda variável beira a aleatoriedade, mas no longo prazo, o preço converge para o valor, é justamente nesse momento que as teses dos gestores se concretizam.
E aí vem a pergunta principal, por que o brasileiro investe tão mal? Inevitavelmente você vai pensar na falta de educação financeira, na vontade de ficar rico rápido, no desespero que estamos vivendo nos últimos anos e no desafogo emocional que é investir, afinal, comprar é igual a sonhar. O exercício de gerar uma ordem de compra é ótimo, mas dura pouco menos de um dia. É como o primeiro gole de café após uma manhã dura de trabalho, a cafeína mal entra no seu corpo e suas pupilas dilatam, a energia vem, talvez muito mais na forma psicológica do que física, mas isso pouco importa, a energia vem.
Alguns diriam que o brasileiro investe mal por gostar de “dicas quentes”? Ou até por tentar replicar o que os amigos estão fazendo, sem necessariamente entender o que está sendo feito. Pois bem, existem diversas conjecturas, mas uma coisa é fato, veja abaixo que o interesse dos brasileiros pela bolsa aumenta na medida em que o desempenho do índice melhora:
Ou seja, quando a bolsa vai bem, mais pessoas pesquisam sobre o tema no Google e quando ela vai mal, ninguém quer saber. Talvez você não fique surpreso com esse resultado, afinal, uma simples conversa de bar com os amigos pode demonstrar isso com baixíssimo grau de esforço e altíssimo grau de acuracidade.
Mas também não é preciso se esforçar muito pra saber que esse tipo de comportamento está errado, não é por acaso que Luís Alves Paes de Barros, um dos maiores investidores da bolsa brasileira, diz algo tipo: aqui sempre sai negócio, se tem muita gente querendo comprar, eu vendo, se tem muita gente querendo vender, eu compro.
Não perca demasiado tempo com tecnicidades se o seu comportamento e mentalidade não estiverem corretos. Valuation importa? Sim. Prêmio pelo risco na classe? é claro. Comportamento e mentalidade, por incrível que pareça, importam ainda mais.
No livro Psychology of Money, Morgan Housel narra com maestria os casos de Ronald e Richard, aqui eu vou resumí-los rapidamente. Ronald trabalhava numa loja de departamento dos EUA, limpava o chão e abastecia gôndolas. Quando faleceu, descobriram que ele tinha deixado para a família cerca de 8 milhões de dólares. As pessoas foram atras de como isso aconteceu e descobriram que Ronald simplesmente investia assiduamente um percentual do salário no S&P. Isso foi feito por décadas, Ronald não precisou se importar com crises, bolhas, preços e guerras, ainda assim deu tudo certo.
Já Richard representa justamente o extremo oposto. Ele se formou em Harvard, trabalhou por um bom tempo no mercado financeiro, era considerado prodígio e se aposentou aos 48 anos. Mas na mesma época em que Ronald faleceu, ele teve sua falência financeira declarada.
Essa história pode nos levar à conclusão de que investir mal não é uma particularidade dos brasileiros, sendo uma característica do ser humano em si. E, de fato, existem dados emblemáticos como a fatídica pesquisa feita por Peter Lynch com cotistas do lendário Mangelan Fund.
Entre 1977 e 1990 o fundo rendeu nada menos que 29% ao ano. Nesse mesmo período, o S&P se valorizou 15,5%, porém, o excesso de retorno não foi necessariamente para o bolso dos cotistas. Segundo Lynch, o retorno médio dos seus clientes foi de apenas 5% ao ano. Essa é a diferença entre o retorno do investimento e o retorno do investidor. É possível acertar no produto e ao mesmo tempo errar no comportamento. Isso é o que chamamos de behavior gap.
Mas mesmo diante desses dados, é possível dizer que o investidor americano se encontra à frente do investidor brasileiro. Fizemos a mesma pesquisa do Google Trends e ela mostra que o desempenho do índice vs o interesse dos americanos por investimentos possui dados muito mais favoráveis, veja abaixo:
Detalhe: a correlação é negativa, ou seja, quando a bolsa sobe, na média, o investidor americano procura menos sobre o assunto.
Por fim, será que investir mal é uma particularidade dos investidores brasileiros de ações ou podemos dizer que investidores de outras classes de ativos também caem nos mesmos erros? Os investidores de Bitcoin demonstram estar sofrendo dos mesmos sintomas:
Segundo Howard Marks, “um dos fatores mais significativos que impede os investidores de chegar a conclusões apropriadas é a tendência de avaliar o mundo com sentimentalismo, e não com objetividade”. É isso, sentimentalismos à parte, os mais objetivos não sofrem de FOMO e tendem a se dar bem.