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Investimentos

9 de maio de 2022

11 Minutos de leitura

Horizonte de investimento

“Alguém está sentado na sombra hoje porque alguém plantou uma árvore há muito tempo”
(Warren Buffett)

 

Tempo. Procurar essa palavra no google pode ser nostálgico, sobretudo pelas músicas de bons artistas (e outros nem tanto) que buscam explicações. Os físicos diriam que ele é relativo, os poetas, que ele é indiferente, já os mais espiritualizados diriam que ele a Deus pertence.

Para Ray Cummings, “o tempo existe para que tudo não aconteça de uma vez só e o espaço existe para que tudo não aconteça com você”. A mitologia grega, de fato, personifica o tempo em Cronos, que por coincidência (ou não?!), é o nome do empresarial pelo qual vos escrevo, a Åpen, por sinal, deve continuar por aqui até meados de junho. Horizonte de tempo.

O ponto aqui é, quanto o tempo influencia nos investimentos? Quem tem mais tempo ou menos tempo disponível deve investir de forma diferente? Se sim, qual é o investimento adequado a cada horizonte de tempo?

Não por acaso, um ditado árabe diz: “quem planta tâmaras, não colhe tâmaras”. Isso porque as tamareiras levavam de 80 a 100 anos para produzir os primeiros frutos. É claro que com todos os avanços tecnológicos envolvidos atualmente, esse tempo de colheita caiu abruptamente. Aliás, quanto tempo você acha que demora para plantar e colher essa mesma fruta hoje em dia? Eu chutaria algo próximo a 50 anos, por pura ancoragem. Mas a verdade é que 10 anos são suficientes.

Ao contrário da tâmara, que é originária do Oriente Médio, a Jabuticaba é nativa da mata atlântica brasileira. Ironicamente, o nome dessa fruta é utilizado de forma pejorativa em expressões políticas para indicar algo que só existe no Brasil e não serve para nada. Mas aqui ela será útil, então, vamos imaginar que, por algum motivo, você goste de jabuticabas o suficiente para esperar o tempo necessário para plantá-las e comê-las. Vamos supor que você já tenha o local ideal para a empreitada, faltando apenas a escolha do método adequado. Grosso modo, existem duas opções: plantar uma semente ou uma jabuticabeira enxertada, que é fruto de um processo de fusão entre uma planta nova e outra antiga, o resultado disso é traduzido em produtividade em termos de tempo e colheita.

Pois bem, a primeira opção demora cerca de 10 a 15 anos para render os primeiros “dividendos”, já a segunda, cerca de 7. Na prática, o nome disso é horizonte de investimento, você acabou de enquadrar o produto adequado dentro da expectativa correta. Sem essa informação prévia, a jabuticaba certamente seria fonte de frustração, quiçá prejuízo. É claro que você paga caro por isso, colher frutos na metade do tempo tem seu preço. Essa talvez seja uma das grandes verdades do mundo dos investimentos, se você tem menos tempo para investir, não espere lucros exorbitantes.

É mais ou menos o que acontece quando alguém diz para você: “vamos alinhar as expectativas”. Eu tive um chefe que “ridicularizava” essa frase ao ponto dela deixar de ser utilizada na empresa, afinal, ele dizia: “alinhar expectativas é sempre de baixo pra cima e não de cima pra baixo”. Essa não foi fácil de engolir, mas, é inegável que ele estava correto. Trazendo para o universo de investimentos, o ideal é que você de fato nivele suas expectativas por baixo, o que na prática significa considerar investir em determinadas classes de ativos somente se elas estiverem dentro do seu tempo adequado de espera.

Cada produto e classe de ativo tem o seu horizonte de investimento adequado e qualquer ordem de compra gerada, sem clareza dessa informação, pode trazer dores de cabeça. Na prática, poucas são as pessoas que plantam árvores sabendo quanto tempo precisam esperar.

Sendo assim, veja abaixo o que seria o horizonte mínimo ideal de investimento para as principais classes de ativos:

Os leitores mais atentos provavelmente vão notar que o horizonte de investimento é diretamente proporcional ao risco implícito nas classes. Ou seja, quanto mais risco, mais tempo você precisa ter em mente para não se frustrar.

Cuidado, pois horizonte de investimento não deve ser confundido com liquidez. Algumas corretoras, inclusive, produzem bons relatórios informando a liquidez da carteira do investidor, não é essa informação que consta aqui, afinal, a liquidez da grande maioria das classes acima é bem maior e você consegue resgatar em menos tempo.

Por exemplo, em média um fundo de ações disponibiliza o dinheiro resgatado em 30 dias, mas o horizonte de investimento ideal para sua classe é de no mínimo 5 anos. Então, vamos passar aqui rapidamente pelas classes, suas peculiaridades e seus respectivos horizontes. É importante ressaltar que essas informações não são consensuais, falaremos disso mais adiante.

Em relação aos pós-fixados com liquidez diária e indexados ao CDI, o horizonte de investimento adequado é bem pequeno e, não por acaso, muitos investidores iniciantes começam por essa classe. E aí vem um erro constante, o horizonte de investimento da poupança é de no mínimo 30 dias, pois existe o “aniversário” (que, por sinal, deveria ser chamado de “mensário”) e qualquer saque antes disso não gera rendimentos. Já os fundos pós-fixados, tesouro Selic e CDBs de banco com liquidez diária possuem incidência de IOF para transações menores que 30 dias, mas isso não é tão ruim assim, lembre-se que o imposto incide apenas sobre o lucro. Ou seja, é comum perguntarem se vale à pena investir nesses produtos para passar menos de 30 dias e a resposta é “sim”.

Os populares fundos de crédito privado aparecem logo após, tendo um horizonte mínimo de 6 meses. Alguns consideram 3, mas, nesse caso, recomendo um pouco mais de conservadorismo, “alinhamento de expectativa” ou nivelamento por baixo, como você preferir chamar.

Lembrando que bons fundos de crédito privado precisam ter liquidez acima de 30 dias, pois se trata de um mercado de baixa liquidez no qual ocorre o descasamento entre ativo e passivo. Ou seja, os títulos vencem no longo prazo, mas se muitos cotistas resgatarem, o fundo vai precisar vendê-los no mercado secundário, por isso, nesse caso em específico, os 30 dias de liquidez exigidos pelo fundo acabam sendo benéficos para o cotista. Afinal, esse tempo de resgate fornece meios para o qual o gestor tenha mais eficiência na negociação. Caso contrário, você poderia ter sua renda impactada pelo resgate de um grande investidor.

Na crise de março de 2020, por exemplo, houve grande fluxo de saques dos fundos de crédito privado e os que tinham menor tempo de resgate acabaram entregando prejuízo aos cotistas, pois tiveram que “se livrar” rapidamente dos títulos para prover liquidez aos saques. Existe uma máxima que diz que todo ativo é líquido, a depender do preço, foi mais ou menos assim. Os fundos com prazos maiores de resgate se deram bem, pois puderam comprar os que estavam vendendo desesperadamente.

E aí você me pergunta, e os títulos pré-fixados e indexados à inflação? Qual é o horizonte de investimento? A resposta está no vencimento do título, a não ser que você seja trader de renda fixa, o risco é muito maior.

Agora vamos para a próxima classe: fundos multimercados. Talvez outra pergunta que venha à sua cabeça seja: por que três anos? Os fãs de Steve Jobs provavelmente vão pensar nesse número não pela coincidência e sim pela influência cabalística, afinal o lendário CEO da Apple defendia esse número como um “facilitador” à memorização das pessoas. Não por acaso: (1) em 2011 o slogan para promover o Ipad 2 dizia: fino, leve e rápido; (2) O gadget foi disponibilizado nas versões de 126, 32 e 64GB; (3) nas cores preto, branco e cinza. Porém, a verdade é um pouco menos interessante do que isso, o que os gestores dizem é que esse é justamente o tempo necessário para que as teses de investimentos se concretizem. Os investidores que passam prazos menores tendem a depender um pouco mais do momento de entrada (se é de alta ou de baixa) para obtenção de bons resultados. A verdade é que bons multimercados batem o CDI em 99% do tempo em janelas móveis de 3 anos, para janelas menores o percentual cai abruptamente.

Em relação à classe de ações, como já antecipado aqui, fala-se de um horizonte mínimo de cinco anos. Mas se você perguntar para um gestor, certamente ele vai dizer que, por se tratar de Brasil, o ideal é pensar em algo próximo de dez. E, de fato, veja o que aconteceu com a bolsa entre os anos de 2011 e 2016:

Quem esperou cinco anos nesse período e sacou o dinheiro em 2016 provavelmente se frustrou, pois desse ponto em diante, até 2019, a bolsa subiu inesperados 200%. É como se você plantasse um pé de jabuticaba esperando colher a fruta em cinco anos, mas como vimos lá em cima, uma jabuticabeira enxertada leva pelo menos 7 anos para tal.

Dessa forma, saiba que mesmo diante de janelas longas, quando o cenário macro não ajuda, existe a possibilidade de ter que aguardar um pouco mais do que o “ideal” para que o preço tenha convergência para o valor. Aliás, clique aqui e veja o último Åpen Insights sobre o que difere os investidores brasileiros dos americanos. Nele você vai ver, entre outras coisas, que cerca de 50% dos saques efetuados nos últimos cinco anos do fundo Alaska Black, foram feitos por cotistas que sacaram o dinheiro com menos de um ano de permanência no fundo. Não é preciso ser expert no assunto pra dizer que grande parte dessas pessoas perderam dinheiro.

Sendo assim, podemos dizer que o horizonte mínimo para essa classe seria de 5 anos, porém, o ideal seria mesmo uma década. Dessa forma, você fica menos impactado pelos ciclos de mercado e mais impactado pelo valor intrínseco das teses de investimento dos gestores.

Por fim, vamos para os ilíquidos (PE – Private Equity e VC – Venture Capital) e criptoativos. No primeiro caso, é importante frisar que na grande maioria dos fundos o seu capital fica de fato “preso” e você vai depender de janelas de resgate. Nesse caso, não há muito o que dizer, você simplesmente não vai poder tirar o seu dinheiro o horizonte é “forçosamente” longo. Já criptoativos possuem ótima liquidez, mas, como você já sabe, isso não significa que o horizonte de investimento deva ser curto. Para ambas as classes o horizonte mínimo indicado é de 10 anos, mas para teses de cripto talvez seja interessante você separar o dobro desse tempo. Importante ressaltar que esse horizonte para criptoativos está longe de ser unanimidade, assim como quase todo assunto que envolve esse universo.

Pense assim, nos anos 90 nós tivemos a “febre” das empresas pontocom e na crise dos anos 2000, grande parte delas teve que fechar as portas. Nessa época, a Amazon chegou a sofrer quedas da ordem de 90% no seu preço, mas hoje, depois de duas décadas, é inegável que se trata de uma das maiores empresas do mundo. O ponto é, por mais que o mundo tenha vivido uma bolha tech na virada do século, algo interessante estava acontecendo ali, não se sabia necessariamente o que, mas Microsoft, Apple, entre outras empresas, também estavam lá. Tente utilizar essa mesma mentalidade para a classe de criptoativos, há muita revolução tecnológica acontecendo nesse exato momento, muitas delas vão virar pó em alguns meses ou anos, mas algumas poucas vão se sobressair nas próximas décadas.

Portanto, horizonte de investimento é isso, entre com a mentalidade certa e tenha menos dores de cabeça, entre com a mentalidade errada e dependa mais da sorte do que do fundamento. Nos dez anos que trabalhei em uma grande multinacional desenvolvi uma espécie de “padrão” de estímulo para quando as pessoas eram promovidas a cargos de liderança. Para alguns eu desejava “boa sorte”, para outros eu dizia que não era preciso desejar. Espero que você entenda a importância de estar nesse segundo grupo.

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