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14 de setembro de 2022

6 Minutos de leitura

E essa queda recente no mercado americano?

Plot Twist

 

Plot twist ou reviravolta, como diriam aqui no Brasil. É mais ou menos aquilo que acontece quando um filme parece dar sinais de ir para um lado e, do nada, algo acontece para surpreender você e jogar a história para outro desfecho completamente diferente daquilo que você imaginou.

 

Essa técnica de quebra de expectativa faz coisas simples se tornarem emblemáticas. Os melhores humoristas, por exemplo, se utilizam dessa artimanha para contar coisas “mundanas” de forma engraçada. Mas voltando ao plot twist. Você pode até esquecer de um filme, de alguns personagens ou vilões. Mas quando o plot twist é bom mesmo, você dificilmente vai esquecer.

 

Quem não lembra do reviravolta em Ilha do Medo (2010), Clube da Luta (1999) e Uma Mente Brilhante (2001)? Engraçado que o desfecho desses filmes é razoavelmente parecido, mas certamente você foi pego de surpresa no terço final do filme. O sexto sentido (1999), brinca ao fazer praticamente a mesma coisa com você.

 

Grosso modo, existem plot twists de dois tipos:

  • “tipo 1”, que são aqueles dão sinais e praticamente fazem você se sentir burro no final do filme.
  • “tipo 2”, que acontecem simplesmente do nada, esses praticamente ninguém consegue adivinhar.

 

Em 2009, por exemplo, Quentin Tarantino surpreendeu mais uma vez os críticos de cinema com Bastardos Inglórios. Quem viu, sabe. Pra mim, foi um dos melhores plot twists da história do cinema. Dar spoiler de um filme de 2009 é crime? Então me perdoem, mas vou evitar o máximo possível… Em suma, existem várias formas de dizer “3” e esse simples fato mudou toda a história do filme, veja a imagem abaixo:

 

 

Tarantino às vezes até parece que abusa do reviravolta do tipo 2, aquele que não dá sinais. Pois, praticamente do nada, algo muito aleatório acontece e muda completamente o desfecho. Em seu melhor longa, na minha opinião, Pulp Fiction (1994), ele brinca com a mesma artimanha quando um dos personagens principais para em um semáforo e o outro atravessa a faixa de pedestres.

 

O que está acontecendo com a inflação e o mercado americano?

 

Pois bem, recentemente o mercado se viu surpreendido por um revira volta do tipo 1, que é aquele que dá todos os sinais e faz você se sentir burro no final. Estou falando dela: a inflação americana e sua desancoragem.

 

Sob a batuta de Gerome Powell, presidente do Fed, soubemos que a alta de preços seria temporária. E, de fato, “temporário” varia de acordo com a perspectiva. Para uma tartaruga, que vive 150 anos, isso pode significar algo bem diferente do que para uma mosca, que vive 28 dias.

 

Nessa semana, o povo americano descobriu que “temporário” não significa horas, nem dias, nem meses, e sim anos. E não por acaso, o mercado teve uma dor de barriga ontem.

 

 

Veja só, uma das principais ferramentas de política monetária de qualquer banco central são as condições financeiras das famílias. Muito dinheiro disponível resulta em inflação. E uma das características do mercado americano é que mais de 50% da população investe em ações. Logo, quanto mais a bolsa sobe e finge que nada está errado, mais o povo se anima e gasta mais dinheiro. É tipo uma festa barulhenta que o vizinho reclama, mas depois de alguns minutos, todos esquecem disso e voltam a gritar. É bem comum ver em filmes americanos que esse tipo de cena acabe com a chegada da polícia.

 

Quem acompanha aqui, sabe. Falamos de bear market rally (rally de mercado de baixa) quando o mercado simplesmente pareceu esquecer dos sinais que estavam sendo dados. Falamos que o Fed precisava demonstrar tom mais hawkish (pessimista) para que o mercado pudesse sentir a gravidade da situação. No post A anatomia de uma crise, falamos do papel de um banco central de colocar agua no chope do mercado quando esse está aquecido demais.

 

Aqui vai apenas um pequeno trecho:

 

“No mercado financeiro, costumamos dizer que o banco central atua como um garçom de festa de casamento. Não se engane, o objetivo número um de qualquer garçom é te embebedar e o objetivo número dois é não deixar você ficar bêbado a ponto de estragar a festa. É uma linha tênue que separa os profissionais dos demais. Brincadeiras à parte e, de forma análoga, quando o banco central de um país precisa aquecer a economia, ele se utiliza de políticas monetárias expansionistas. É nesse momento que os juros caem, que ocorre uma injeção de liquidez e ânimo no mercado. A festa começa, o som faz as paredes tremerem, parecendo que não há hora pra acabar. Porém, se, por acaso, essa festa se torna “barulhenta demais”, o BC precisa colocar ordem na casa”.

 

Aqui no blog, nós falamos também que a situação lá fora está desproporcional em termos de risco vs retorno. Afinal, há muito ruído para alocar em algo que está precificado levemente acima da média histórica. Pois bem, para essas pessoas, esse pode ter sido mais um episódio de plot twist do tipo 1, que não é faz parte da “aleatoriedade” que Quentin Tarantino utiliza, esse é bem pior, pois é aquele que faz você se sentir burro, as informações estavam lá e você não quis ver, esse é aquele difícil de esquecer.

 

Desancoragem de expectativas

 

Pre finalizarmos aqui, o que o mercado acha que vai acontecer para a frente? Antes disso, é importante ressaltar que os gestores de multimercados brasileiros nunca ganharam tanto dinheiro com posições que se favoreciam da alta de juros do mercado. Isso ocorre, sobretudo, por termos sido forjados nisso: ambiente de inflação. Se tem uma coisa que o mercado não brinca (e muito menos o Banco Central) é com a possibilidade de alta de preços.

 

Por fim, quando olhamos o que o mercado está esperando, dá pra ver que ainda há “otimismo” e todo otimista carrega consigo um pouco de ingenuidade, veja abaixo a projeção do BTG:

 

 

O BTG espera para os próximos meses altas de: 0,75% em setembro; 0,75% em novembro; 0,5% em dezembro; assim como mais 0,25% em fevereiro. Com isso, a taxa encerraria 2022 entre o intervalo de 4,25-4,50%, fazendo seu pico entre 4,50%-4,75%. Veja que há um gap versus o que está implícito no mercado. Só que isso fica para os próximos capítulos, mas não diga que vai ocorrer um plot twist, pois há sinais em cima da mesa, assim como a evidente desancoragem de expectativas.

 

Por Tulio Cavalcanti

 

 

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